É coisa difícil de conceber, de forma anormal e conteúdo vazio.
Aparentemente, trata-se de uma lata cilíndrica (50 cm de altura x 40 cm de diâmetro), cuja superfície espelhada (em folha de flandres) deixa reflectir, sem directamente dar lugar a uma reflexão.
Cortada no cone virtual da vertical e infinita ascensão, a coisa, ainda de pé, passa a possuir dois limites: em cima (ou superior) e em baixo (ou inferior). Uma vez deitada, na horizontal, ela mostra dois outros, ou mesmos, limites: um furo à esquerda e um à direita. Noutra perspectiva: um buraco à frente e outro atrás. Em todos os casos, os orifícios poderão ser fechados/abertos por tampas (ou tampões).
À estática da aberrante coisa, acrescentou-se um suplemento dinâmico: duas asas que facilitam a sua mobilidade; ou duas pegas que ajudam a que se puxe por ela.
Na realidade, a coisa é um objecto de arte. Objecto que violenta o espaço gestáltico de percepção-cognição dos seus duplos utilitários (continente de um líquido, por exemplo) e científicos (figura geométrica), e condensa, economicamente, um gozo particular.
Gozo de quem ? Em primeiro lugar, do corpo do artista, de quem a obra é a parte ergonómica - metafórica e/ou metonímica.
Em que consiste este gozo? Vá-se lá saber. O que foi escrito (Cfr. Copyright. Ana Pérez Y Quiroga, 1995) é que, neste trabalho, a forma separa-se da função, para seguir a ficção. Projecto que convoca expressamente a Des-construção (Geoff Bennington via Derrida) do texto em que se enreda o mundo, o pensamento e a segurança de cada um.
Segurança fálica (ou falogoetnocêntrica).
Pois é a suposta omnipotência do phallus erectus que se tenta aqui cortar, fazer cair, esburacar, numa palavra, cilindrar. Resta que a in-segura força desta forma parece escapar a tais operações, por obra e graça da sua pura materialidade significante.
O objecto, pode, deste modo, ser denominado: BI-DON. Assim composto, o seu nome parece referir à dualidade inscrita no don: a dádiva da linguagem, ou da diferença patente na vida, na sexualidade, na arte... Mas, com ou sem traço de união, a palavra, de origem gaulesa, faz também ressoar a irredutível equivocidade da sua matriz etimológica. BIDON: 1) recipiente, vaso; 2) por analogia, ventre, ama de leite; 3) lençol dobrado de modo a poder encher-se de ar e criar uma ilusão de plenitude; 4) mentira, bluff, falhanço; 5) simulação (Cfr. Petit Robert, Dicionário De Língua Francesa).
Como simulacro da maternidade, BI-DON revela-se un bide, un vide...bidon. Nulo, talvez, mas deu-me e poderá dar (a outros) a pensar.